"A Copa do Mundo e as Olimpíadas são boas oportunidades para se conseguir coisas positivas, mas os interesses por trás delas estão sendo injustos."
Por Sam Green, em 1º/8/11, para o jornal inglês The Independent (tradução feita pela equipe do Cidade):
"A Copa do Mundo e Olimpíadas são boas oportunidades para se conseguir coisas positivas, mas os interesses por trás delas estão sendo injustos. Trata-se de fazer dinheiro da maneira mais rápida, mais brutal possível e as federações internacionais estão permitindo que isso aconteça". É o que afirma o professor Christopher Gaffney, um crítico do modo como as comunidades pobres e os moradores de favelas do Rio de Janeiro estão sendo tratados na preparação para os dois megaeventos esportivos.
Gaffney, um professor visitante americano de urbanismo da UFRJ, diz que 130 favelas foram marcadas para remoção em função da Copa do Mundo e das Olimpíadas, ou por conta de projetos de mobilidade associados. "Esses projetos são feitos geralmente para atender interesses muito limitados, principalmente de incorporadoras imobiliárias e de grandes empresas da construção – autoestradas, aeroportos, etc. Apenas um punhado de empresas faz este tipo de obras no Brasil e suas relações com os políticos são muito próximas."
Gaffney disse que as autoridades evitam intencionalmente a negociação coletiva com os moradores. "A coisa é feita para fragmentar a resistência. Negociam família por família e assim que uma família se compromete a vender, sua casa é demolida imediatamente e, assim, o valor da propriedade ao lado baixa. Dessa forma, as pessoas são colocadas umas contra as outras."
Mais do que os estádios, são os projetos viários as principais justificativas para as remoções, diz Gaffney. “Estes projetos erguem grandes barreiras na cidade – comportas de concreto atravessam as favelas, com ônibus em alta velocidade dentro delas. Estes projetos tendem a violar todas as leis que deveriam proteger os direitos humanos, porque eles afastam as pessoas para lugares onde não conhecem ninguém, para casas que não são necessariamente melhores do que as deles e longe de seus empregos.”
Grande parte dos lugares de destino destas famílias são enormes projetos públicos de moradia popular, que se alastram pelas zonas pobres ao norte e oeste do Rio de Janeiro, onde a maioria dos moradores das classes afluentes da Zona Sul que aparecem nos cartões postais têm medo de ir. "Muitas dessas áreas estão sob o controle de milícias e nós temos ouvido falar de casos de pessoas enviadas pra lá e que tem de pagar às milícias 40 mil reais para ficar em suas novas casas."
Uma articulação de grupos sociais, ONGs e acadêmicos que se autodenominam Comitê Popular da Copa e dos Jogos Olímpicos, organizaram uma marcha no dia 30/07/11 [dia de sorteio das chaves da Copa, na Gávea], para protestar contra as remoções de favelas, o mau uso do dinheiro público, o jogo das grandes empresas e os preços dos ingressos.
Gaffney descreve as fortemente armadas Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), que enfrentaram o controle de algumas favelas por traficantes, como "um primeiro passo necessário", acrescentando que uma sensação de mais segurança nas comunidades é um resultado positivo. "Mas deve haver investimento igualmente maciço em educação e urbanização. Entretanto, o principal ficou em proporcionar um espetáculo público de segurança para o mundo exterior. As UPPs não entram em silêncio, eles entram com armas pesadas e são seguidas pelos meios de comunicação. Elas são invasões.”
"Você vê um fortíssimo boom no valor das propriedades em torno das áreas protegidas e há uma clara relação entre espaço urbano e garantia de abertura dos mercados de consumo. Em alguns casos, empresas de televisão a cabo vão vender seus pacotes uma hora após a entrada das UPPs."
Outra voz crítica é a de Theresa Williamson, diretora executiva da vigilante Catalytic Communities. "A Copa do Mundo e as Olimpíadas estão aumentando a desigualdade numa cidade que já é notoriamente desigual", diz ela. "As favelas do Rio de Janeiro não são dominadas pela sordidez, são bairros populares que foram construídos pelos moradores ao longo de gerações.”
"O resultado são comunidades que agora possuem um forte estoque de moradias, onde os moradores têm acesso a empregos e escolas e onde eles construíram amplas redes sociais das quais dependem. A imagem transmitida pela classe governante do Rio de Janeiro, de que estas comunidades são violentas, pobres e marginais e que a sua remoção não tem consequências significativas – que é até um benefício – é errada.”